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Noite tomada de Assalto.



À quem estou defendendo? À mim que sofro as represálias de um sistema que me exclui pelo cabelo que possuo? Ao discurso que carrego comigo de ver um preto favelado como um irmão desconsiderado pela corrupção como eu sou? À possibilidade de reverter os resultados de tamanho descaso do estado à populações à margem de uma educação de qualidade, de saúde de qualidade, acuados, sobrepostos, subalternos, sofredores como eu sou? 

O que leva alguém ao crime? O que leva alguém à não identificação de si no outro? O que leva à alguém subtrair de um dos seus a dignidade? Do prazer do outro, seu contíguo, usufruir de um bem que é dele de direito? 

Hoje fui assaltado, eu e uma outra. Meses de reclusões, de bares não idos, de festas não curtidas, de negações, de trocas por nada? Por uma não identificação? O que leva um preto como eu me subtrair, dizer que vai me matar se eu reclamar por um direito meu de possuir um bem, fruto de meu trabalho, de resistência à minha exclusão, à nossa exclusão?

Como um negro como eu, excluído como eu, pode me lesar? Como eu, desempregado, negro, homossexual, membro de uma religião africana, oriundo de uma família de classe financeira menos abastada pode ser assaltado por um, dois negros?

Nem este reconhecimento foi permitido à obtenção ao meu irmão?

Terá sido ausência de reconhecimento meu? Achar que o Power do Black me imunizaria destes infortúnios? Ou achar que o fato de eu ter acesso, por mérito unicamente meu e dos meus, à uma educação dita de qualidade, me isentaria de ser subtraído mais uma vez?

Não os odeio, mas sinto muita raiva. Raiva por ser tirado de um estado de felicidade e e comemoração pelo evento maravilhoso realizado por mim e pelos meus colegas, futuros administradores (administra-dores). Raiva por ver à mim e à minha colega de infância e de turma coagidos aos que sequer possuem perspectivas , talvez por escolha, não sei. Raiva por tê-la ouvido dizer que os queria mortos. Raiva por ter visto minha amiga chorar pelo segundo aparelho celular roubado em menos de um mês. Raiva por nem sequer pretender requisitar de volta o que era meu, nosso. Raiva por não ter revertido a situação, de fazê-los perceber que somos um, que estamos à deriva das imposições excludentes. Raiva por não ter um Estado que nos acolha, que não saciem nossas necessidades, as nossas e as deles. Raiva por sequer terem uma noção mínima de afetos, compreensões maiores que as que possuem, Identidade.

Porém agradeço por não ter lembrado que possuía em meu bolso uma tesoura, "arma branca". Por não terem revistado meu bolso que continha o dinheiro da produção do evento ao qual participei. Por não terem encontrado a minha raiva, o meu descompasso, o meu ódio ressentido, a minha revolta. Agradeço por terem encontrado a minha felicidade, o prazer de um dia de vitórias, de agrados, de reflexos de minhas potencialidades, dos acertos, dos afetos dos meus. De minhas outras queridas terem ido ao perceber que algo de ruim aconteceria, de terem percebido e fugido do que seria acometido à elas também caso tivessem ficado por mais 30 segundos.

Amanhã ele terá aparelhos bloqueados, chips bloqueados, R$ 20,00 gastos em 4 pedras de crack. Não agradeço por isto. Mas continuo com raiva e que esta me sirva de motivação para continuar conquistando para mim e para os meus.


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